EXTINÇÃO DOS TRENS DE PASSAGEIROS, UMA PATIFARIA GOVERNAMENTAL





Quase 30 anos depois de haver coordenado a inauguração da linha turística ferroviária na serra (o evento ocorreu em 26/10/86), voltei a embarcar neste sábado, em Bento Gonçalves, em um dos vagões da Ferrovia do Vinho. O trem, tracionado por uma locomotiva a vapor, seguiu para Garibaldi e Carlos Barbosa. Embora já noite fechada, deu para perceber o cuidado que a Giordani Turismo, operadora dos passeios, tem com a manutenção do material rodante, que, quero crer, ainda deva pertencer ao governo, o mesmo não acontecendo com as concessionárias da ferrovia brasileira, que já depredaram tudo. Quero, então cumprimentar a Giordani Turismo por essa dedicação e por manter os passeios com vários atrativos antes e durante o percurso. Uma coisa que também me chamou a atenção é que a empresa continua prestigiando a Rede Ferroviária, cuja sigla consta do tender da locomotiva.
Esse passeio, que fiz em companhia de familiares, trouxe-me muitas lembranças, boas e más. Boas, dos 16 anos em que trabalhei na RFFSA, como assessor de Imprensa, aprendendo muito e fazendo boas amizades; más recordações, porque acompanhei o lento, gradual mas decidido propósito de acabar com a empresa. Um dos fatos para mim mais marcantes nesta fase foi a decisão governamental de acabar com os trens de passageiros. Considero isso uma patifaria. Era obrigação do governo manter uma opção de transporte mais barata para a população de baixa renda. Os trens Noturno e Misto, que serviam às linhas de Santa Maria, Uruguaiana, Livramento, Cruz Alta e São Borja eram chamados "trens de compadres", justamente porque as pessoas embarcavam numa estação e viajavam até uma ou duas seguintes para visitar um compadre ou comadre, e em trechos que não eram servidos por nenhum outro meio de transporte. Mas agora entendo: fazia parte da preparação para entregar as ferrovias ao setor privado, que já exigia realizar seu futuro trabalho sem o "inconveniente" dos trens de passageiros. Foi, realmente, a mais pura patifaria governamental.
Aliás, foram muitas as patifarias infringidas pelos governos à Rede Ferroviária Federal. Tudo para deixá-la enxuta para os amigos do rei que viessem a assumi-la. Os governos aplicavam muitos encargos à Rede para suprir deficiências na área de transportes, e a empresa não recebia nada em contrapartida. Arcava com tudo só com o seu faturamento. Obviamente que as concessionárias não tiveram obrigações a cumprir. Ou se tiveram, não as cumprem. A desestatização da ferrovia foi um golpe baixo e sujo contra o povo brasileiro. Como é que meia dúzia de interessados resolveram acabar com a empresa sem consultar seu dono maior, que é o povo? O povo, este, quando se deu conta, já estava tudo decidido e sacramentado. Por essas e por outras é que continuo achando que o Ministério Público poderia e deveria investigar a nebulosa desestatização da RFFSA. Já que descobriram tanta patifaria em sua coirmã, a Petrobrás, por certo a Rede Ferroviária também seria uma boa fonte de pesquisas, já que as épocas dos malfeitos nas duas estatais coincidem. (Nas fotos, de minha autoria, um dos carros de passageiros homenageando a Viação Férrea, interior do carro e o tender da Maria Fumaça com o inesquecível símbolo da RFFSA) (Publicado simultâneamente com minha página no Facebook https://www.facebook.com/luizcarlos.vaz.96)

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